Multiverso (multi-universo)


A investigação do processo de criação da artista busca compreender e discutir através de suas obras  a crença na existência de mundos paralelos, de múltiplos universos. Onde sua produção artística se caracteriza como obra, depois objeto e em seguida como objeto enquanto processo do fazer artístico.


A  artista propõe o acompanhamento teórico-crítico de seu processo de criação na tentativa de suscitar reflexões  sobre o fazer artístico, enquanto ação. Onde o espaço / tempo não são tangíveis mas ferramentas de nosso entendimento animal, no qual carregamos o espaço e o tempo dentro e em torno de nós. É nossa consciência que cria o universo material, não o contrário. 


Sua pintura é um estado d’alma,  que extroverte aqui e ali, sem outro objetivo que não o de comunicar a cada obra um sentimento, uma emoção, uma lembrança. Enfim, é uma transposição de seres, coisas, momentos, gostos, olfatos que vivemos no presente, passado, no futuro negando uma visão “pronta” do mundo.


A marca desta série de trabalhos e sua pesquisa  é propor o questionamento da própria linguagem e sua leitura. Uma abordagem crítica que procura distinguir  algumas características específicas da produção criativa e, entender os procedimentos que tornam essa construção possível. Ao reconstruir estas abstrações a artista nos mostra, semioticamente, um sistema de representação individual, mas sempre inseridos na complexidade do conceito de multi-universo.


A diversidades de resultados estéticos pretende enfrentar o encapsulamento da obra enquanto produto pronto, acabado, isolado em si mesmo. Opta por enfatizar as escolhas da artista em seu processo de elaboração das obras, não somente como o intuito de localizar o objetivo da criação na especificidade de uma linguagem, mas para investigar as relações de transformação e, com isso, resignificar o conjunto da  obra, que  também, não se apresenta mais como produto acabado, mas como objeto em processo de transformação do universo material.


Sua estética não significa um fim em si mesmo, nem mesmo o fim, apenas um meio à disposição da liberdade de ação, que ao se apropriar das técnicas e dos suportes tradicionais questionam o próprio visível. Busca o diálogo formados pelas sobreposições de camadas de tintas, cujo  impacto pictórico espelha mais que materiais e idéias, mas a forma como as duas coisas se relacionam. É muito mais uma questão de ética do que de estilo.


Os diferentes resultados estéticos evidenciam-se como ferramenta para se ler a ação que está em movimento, em busca de uma comunicação intrapessoal com suas memórias acumuladas (métodos e técnicas) ao mesmo tempo que  dialoga com aspectos da cultura que esta inserido. Como pensar e meditar acerca dos acontecimentos imprevisíveis que permitem revelar outras possibilidades, que não apenas representações dadas a priori pelas determinações do impessoal. Em lugar de tentar bloquear a emergência dos sentidos singulares que se desvelam, permite uma apropriação temática da experiência.


Busca não somente compreender os diferentes modos de produção que surgem ao longo do processo de criação, mas também investiga as diferentes ações criativas / mecanismos imaginativos para produzir um “objeto” de arte que discute verdades inseridas em seus processos de busca e, portanto, não absolutas e finais.


Os caminhos para chegar ao final da ação são imprecisos, e se movimentam em várias direções não lineares. Por vezes  as linhas que escorrem seguindo uma imprevisibilidade contida faz uma reflexão e tematização acerca da impossibilidade de controle absoluto das condições da existência do homem. Repelindo esse lugar de controle e asseguramento absolutos, permitindo-se pensar a possibilidade da entrega, "deixar ser" em relação ao mundo.







É definitiva, para a compreensão de sua obra, a afirmação de que se trata de uma percepção maior da natureza e dos fenômenos naturais. No qual o estudo da gênese se preocupa com o gesto, com o signo, enquanto índice que se move pela complexidade do fazer. E essa série de trabalhos basicamente postula que em determinado momento o Universo se divide em inúmeros casos semelhantes e no momento seguinte, esses universos “recém-nascidos” dividem-se de forma semelhante, negando uma visão “pronta” do mundo, é um sonho dentro de um sonho.  


Por vezes a artista intuitivamente constrói imagens que obedecem a uma lei de escalas, em que o mesmo padrão é repetido em distâncias diferentes, fazendo com que o mesmo padrão reapareça em escalas diversas. Sua investigação dos processos internos e externos se desenvolvem à fabricação de algumas obras basicamente ilustram aquele fugidio momento no qual o universo se divide em inúmeros universos e no momento seguinte, esses universos “recém-nascidos” dividem-se de forma semelhante seguindo uma precisão matemática que só podia ser encontrada em forças da natureza.





O espaço consiste em muitas esferas de insuflar que dão origem a esferas semelhantes, que por sua vez, produzem esferas em números ainda maiores e assim sucessivamente, até o infinito. No universo eles são separados e não estão cientes da existência um do outro mas representam partes de um mesmo universo físico.



Em alguns desses mundos podemos estar presentes e neles teremos uma determinada estética e,  ao reconstruir estas abstrações a artista nos mostra, semioticamente, um sistema de representação individual, mas que tende a caminho da integração cultural daquele mundo especifico e , essas obras são finalizadas com cores fortes e atrativas, seguindo uma estética naturalista acompanhada de flores, arabescos e rendas que envolvem ecossistemas.




Essa etapa da investigação descreve espaços carregados de funções e variedades de escalas, levando-nos a uma análise onde sua percepção se expande e se contrai, desde as micro-partículas aos contornos das maravilhas naturais do Rio de Janeiro, às estrelas do céu. Ao observador é facultado o que quer observar, o micro ou o macro, o material ou o metafísico.





Ao contrário da psicanálise, na abordagem da artista, o que está em evidência não é o autor da obra, mas o sujeito enquanto agente de uma ação, enquanto fazedor. Tem como meta à atividade critica e não uma obra em particular ou mesmo a artista em si como na abordagem psicológica, com o intuito da reconstrução dos procedimentos internos e, sim entender a transformação processual do conjunto de obras.


A artista, estabelece consigo diálogos internos e, neste sentido, preocupa-se com o processo da obra, com a poética do gesto. Vê o processo de elaboração como forma de reflexão interna, como modo de construção e, ao experimentar, torna-se capaz por meio das interrogações e dúvidas, desestabilizar-se de suas verdades e ativar-se no seu processo construtivo.


Faz reflexões de toda espécie ao assumir esse espectro experimental, empírico. Aglutinando várias vertentes consagradas busca alternativas de aprendizado independentes. Instigada pela criatividade e ecletismo de Roberto Burle Marx (famoso arquiteto e paisagista brasileiro que possui diversos talentos), busca inspiração na estética de seus jardins. Nesse universo enfatiza a essência da tela bidimensional com composições de aspecto fluído, flexível e de grande leveza, com formas orgânicas, sinuosas e linhas retas.





Durante o processo de realização das obras, diferentes formas de diálogos, internos, se estabelecem.  A artista internamente, exigir de si e da matéria interrogações permanentes, isto porque “o ato criador é resultado de uma mente em ação.


Acreditamos que, pelo modo de agir, a artista nos permite  pensar os gestos como signos, não apenas do ponto de vista social e convencional, mas como uma relação de representação perceptível com as realidades representadas. E nos revela sua forma de diálogo com seu espaço-tempo de natureza múltipla, e como o seu olhar se movimenta e se materializa no seu projeto poético e como isso o faz torna-se particular à ampliação de resultados estéticos.


Ao fazer e refazer suas obras a artista articula mecanismos processuais internos e externos, constrói e se reconstrói como sujeito e autor, ao errar, mas também ao acertar, pois ao reconstruir refaz também seu modo de pensar, ao encontrar novas possibilidades o errado poderá ser reavaliado, repensado, recriado e pode contribuir para o surgimento de novos conceitos. E mesmo, não contendo uma linearidade, constitui-se como uma espécie de diário visual, uma preparação para construções narrativas visuais, meio de explicitação e materialização poética, através da qual revela seus conceitos de mundos.










Compõe seu trabalho por camadas de pinturas contínuas e sobrepostas, expressando em seu resultado, sua inúmeras possibilidades. Entretanto, por não se configurar como linguagem definitiva seus trabalhos  apresentam-se como espaços para o possíveis realidades.  Partem de um projeto poético, porém imbuídos de uma história maior onde a artista registra suas idéias, constrói hipóteses, testa possibilidades, contudo, percorre caminhos vagos, incertos, em busca de encontrar, pelos materiais e pela técnica,  respostas, caminho este, às vezes, marcado por dúvidas e angústias, mas que, aos poucos, vão sendo explicitadas nas experimentação.

A mistura de pinceladas marcadas com a tinta escorrida reflete a atitude de dizer sim e não simultaneamente às solicitações do mundo, utilizando os objetos técnicos normalmente, mas também permanecendo livre deles, impedindo de ser absorvida por eles. Desprovida de uma pretensa hegemonia, a tinta escorrida anuncia os acontecimentos imprevisíveis que nos vêem ao encontro e nos colocam diante da impossibilidade de controle absoluto.


















O reprocessamento da linguagem do Expressionismo Abstrato visa a produção  de uma estética formada pelas sobreposições de camadas de tintas, na qual a tinta, aparentemente solta, que respinga sobre a tela, acaba por proporcionar um entrelaçado de linhas e formas que formam imagens.  Terá como função nos dar esclarecimentos sobre o modo como a artista olha para o espaço externo, recorta e colhe, no ambiente, as informações e como passa, pelas técnicas, esses conhecimentos e experiências para as imagens que constrói.





Significa buscar entender criação não como um ato fechado em si, mas como uma ação sustentada pela procura, como experimentação, como hipótese para a construção de novas realidades, não absolutas, mas falível ao erro e ao acaso. Posto, criação deve ser entendida no sentido da busca.


Tal situação de incompletude abre-se para a mobilidade de signos e resultados estéticos e , por estarem os signos trajetando por caminhos paralelos, estarão sempre abertos para intervenções e, portanto suscetíveis aos desvios de direções e de resultados estéticos. Favorecendo assim o surgimento de novas idéias, abrindo espaços para novas hipóteses  ou para a renovação de idéias ou mesmo para os acasos. Pois movimentam-se em continuidade permanente em realidades paralelas.


Portanto a obra de Roberta Dacosta é um libelo artístico que transforma a relação entre observador e objeto, inerente à própria gênese criativa, indivisível.